quinta-feira, 23 de outubro de 2008

A HORA E A VEZ DO BONÉ



É, boné. Aquele que se põe na cabeça. Antigamente era usado por pescadores ou por trabalhadores que abriam valas nas ruas. Em campanha política já foram distribuídos aos milhares, hoje podem custar até um salário mínimo e estão na cabeça de adolescentes e bandidos.Pois bem, há algum tempo discursava em vão com um irmão sobre a teoria e a natureza do boné. Tentava convencê-lo de que, no passado, demos importância ao pigmalião, as meninas fazendo pintas com lápis no rosto, e uma “franjinha” sobre a testa mais conhecida como “pega rapaz”. Usávamos boca-de-sino e costeleta até o canto da boca. Camisa e calça xadrez. Bota, com bico de aço, e no salto também pra fazer barulho. Achávamos aquilo o máximo. Disse-lhe que eu mesmo era vidrado num sapato cavalo-de-aço, salto alto e grosso com as camadas de madeira aparecendo, envernizado, é lógico. Tinha uma sola tão alta que quase exigia degrau. Tentei convencê-lo de, que naquele tempo, o futebol também estava sob a suspeita de ser pecado. Não era “tão” pecado quanto ir ao cinema, mas que teve gente sendo banida da igreja por gostar do tal da bola, olha se teve. Era de capotão, e a gente passava sebo derretido para recuperar o couro. Quando a turma do capotão assumiu a liderança das igrejas, daí foi a vez do pecado do capotão ser banido. Esse é o tipo do pecadinho sem-vergonha: some na geração seguinte. Hoje o futebol mudou de time, e os santos (não o da Vila Belmiro) estão liberados. Só que na época, a coisa foi feia. Tinha gente contra o futebol, a favor, e até quem não se importava muito. Fazíamos assim, meio escondidos, desafiando a autoridade, mas dava tempo de terminar a partida antes das oito da noite, na segunda, para chegar correndo ao culto de oração. O cabelo molhado e a falta de chuva testemunhavam contra, e as pessoas faziam um silêncio a favor. A cumplicidade às vezes funciona! Todos sabiam, ninguém perguntava e nós ficávamos quietos. Fizemos bem em ter jogado futebol. As pessoas que eram contra, mudaram de idéia. Não perderam nada. Nós teríamos perdido parte da nossa juventude. Agora é a hora e a vez do boné. Tenho estado meio deslocado do mundo, confesso. Não sabia que o boné se tornou no novo vilão, um verdadeiro desafio à fé. Fiquei sabendo por aquele irmão, que impaciente considerava o uso do boné uma afronta. Alguma providência deveria ser tomada, pois uma decisão em Assembléia só tem a opção de ser obedecida. Disse-me que a igreja havia discutido a permissão ou não do boné. Pessoas, provavelmente, fizeram rodinhas para que os argumentos fossem purificados. Adolescentes foram acossados em casa, diante dos pais que desejavam defender a imagem da família na igreja. É claro que não faltou Bíblia. Lida de canto, meio de lado, com uma hermenêutica cujo resultado só poderia dar no que deu: o boné foi condenado. É claro que isso não me convenceu. Tentei dizer-lhe que, se no nosso tempo o charme era a calça, camisa e sapato, hoje é o boné, camiseta, bermuda e tênis, caros, muito caros. Anda-se, e até prefere-se, bermuda e camiseta amassadas, mas um mano que se cuida, tem um boné da hora, tipo chocante, tipo massa, tipo, beleza, véio. Só que o meu interlocutor estava irredutível: boné é coisa de bandido. Calça também, mas nem por isso eu ando nu! Há uma moda da bandidagem que está invadindo as nossas casas ele disse. Talvez não seja bem uma moda da bandidagem, mas da favela, da pobreza, dos excluídos, coisa de gente pobre, que burguês confunde com pecado. Coisa de mau gosto, porque o bom gosto não está no morro. Daí o limite entre a cultura e a religião ser tão estreito que ninguém sabe direito onde começa um e termina o outro. Tem coisa que pode, tem coisa que não pode. O que não pode a gente chama de pecado, mesmo sem saber direito o que significa. A graça fica curta. Não fica entre o salto do cavalo-de-aço e o boné, onde se encontra o que chamamos de pessoa. Ou é tão alta que está acima do boné, onde não existe nada, ou abaixo da sola, que também não tem nada, e o resultado é o mesmo. Tudo isto é incluído por tabela no fugir da aparência do mal, ou nas coisas semelhantes a estas acerca das quais vos declaro que os cometem tais coisas não entrarão no Reino de Deus. Estes textos servem para tudo: desde evitar um refrigerante, que pareça cerveja, por dois reais; ou não tomar um suco de uva que pareça vinho, por dois e cinqüenta. Só que ver um adolescente feliz na igreja, não tem preço!A graça compra o que há de pior e dá o que há de melhor. Comprou o pecado e a morte. Dá a vida e o amor. Não está à venda por dinheiro, e se tivesse, nenhuma quantidade seria suficiente (Isaías 55:1). E tem gente tentando trocá-la por boné.O boné entra aqui como o discurso do novo, do que não faz diferença, mas que agride só por ser novo. Sob a ótica da moralidade, não é ausência de roupa; sob a ótica do bom gosto, tem boné que custa mais que terno. Sob a ótica do pecado, parece que o boné ficou sem saída pelo simples fato de representar jovialidade, mocidade, rebeldia, contestação, um desafio a um sistema constituído que se vê por ele ameaçado. Um sistema que tem medo de boné deve ser muito frágil, e na sua fragilidade a única forma de superá-lo é utilizando os mecanismos do poder: fica decretado, a partir de hoje, e proibido, sem qualquer justificativa, o uso do boné revogam-se as disposições em contrário. Uma comunidade que esquece o ser humano que está abaixo do boné, não dá nem pra comentar. A propósito, eu não disse nada.

pr. Natanael Gabriel da Silva

7 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom esse texto.. Vale a Pena ler..Galera.. vamo comnetar Pelo amor de Deus...

Mel disse...

Quem faz parte da JUBASA só de coração e não de geografia, também pode comentar??

Eu sou a irmã da presidenta, e diria que nunca em lugar nenhum do tempo ou do espaço houve uma presidenta tão fofinha....

Tenho uma crítica pra fazer (calma, eu prometo que é construtiva):
A enquete colocada ali em cima não tem a opção "está massa, tem que ficar assim" -> seria meu voto.

;)
Beijos, galera!

Anônimo disse...

Claro que Pode mel, sinta-se em casa,Jubasa no coração é o mais importante.. hauhau

Participa e veja as novidades mel.. alias todos vcs que leêm façam isso abraços
Milena

Unknown disse...

Nossa, realmente muito interessante a questão do boné...
as pessoas nem imaginam o quanto isso traz problemas...
Como pregar pra um jovem que Deus o ama como ele é se a igreja pregar que nem boné ele não pode usar??
As pessoas tem que ter bom senso e enxergar esse tipo de coisa!

É...certos anciãos tem que rever seus conceitos...

alias...eu tbm não disse nada..

Jonathas Oliveira disse...

HAUhUAhUAHUAHuHAuAH

Anônimo disse...

ahahahah Foi muito bom o comentario amanda. ahahahah Bem discreta..

Henrique disse...

Quando crescer quero escrever igual a meu pai :-S